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Por que o tema da liberdade religiosa preocupou Bento XVI?

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Aleteia Vaticano - publicado em 20/02/13
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A questão da liberdade religiosa no mundo pareceu ser uma preocupação constante de Bento XVI, em seus discursos durante as viagens apostólicas e também em seus encontros com diplomatas e chefes de Estado. Por quê?

 

O Papa, retomando os ensinamentos do Concílio Vaticano II e o magistério de João Paulo II, abordou repetidamente a questão da liberdade religiosa. Em seu pontificado, tornou-se claro que a confissão cristã é a mais perseguida no mundo por motivos religiosos.

Ainda que a preocupação pela liberdade religiosa não seja exclusiva de Bento XVI, mas em geral dos últimos papas, foi um dos temas sobre os quais ele mais falou em seu pontificado.

Esta foi uma questão tratada repetidamente em suas viagens apostólicas, bem como em suas alocuções aos bispos dos diversos países e em seus encontros com embaixadores do mundo inteiro.

Precisamente durante o seu pontificado, ficou especialmente clara a gravidade da situação dos cristãos em muitos países do mundo (por exemplo, na Cúpula da OSCE – Organização para a Segurança e Cooperação na Europa – em Roma, em 12 de setembro de 2011).

O Papa, retomando os ensinamentos do Concílio e do seu predecessor, João Paulo II, considerou a liberdade religiosa como um direito básico de toda pessoa, inerente à natureza humana e uma exigência do bem comum.

A liberdade religiosa, por um lado, é um direito dos indivíduos e consiste na imunidade de coação em matéria religiosa, ou seja, é o direito a não ser coagido neste campo. Por outro lado, é também um direito que as confissões religiosas têm de organizar-se e manifestar publicamente suas crenças, sem mais limites que os que derivam da ordem pública.

Em sua mensagem para o Dia Mundial da Paz 2011, o Papa ofereceu as chaves do seu pensamento sobre a liberdade religiosa: a primeira e fundamental é que esta liberdade faz parte do direito fundamental à vida, a uma vida religiosa (n. 4). A liberdade religiosa não é patrimônio exclusivo dos crentes, mas de todos os homens e povos; é um elemento imprescindível de um Estado de direito; não pode ser negado em prejudicar ao mesmo tempo os demais direitos e liberdades fundamentais, pois é sua síntese e seu cume (n. 6). Afirmou também que a liberdade religiosa é o primeiro direito do homem.

A liberdade religiosa, segundo o Papa, está necessariamente vinculada à ideia de laicidade, entendida como autonomia da esfera secular, e tem hoje dois inimigos: por um lado, o fundamentalismo religioso e, por outro, o laicismo agressivo. Ambos são formas especulares e extremas de rejeição do legítimo pluralismo e do princípio de laicidade (n. 8).

O Papa retomou o magistério de João Paulo II, quem, em seus últimos anos, falava sobretudo da liberdade religiosa frente ao laicismo, quando se debatia se incluir ou não a menção às raízes cristãs no projeto da Constituição Europeia.

João Paulo II foi considerado por muitos como o “campeão” da liberdade religiosa. Já em sua primeira carta como Papa ao então secretário-geral da ONU, Kurt Waldheim, ele falou da liberdade religiosa como o primeiro dos direitos. Na verdade, esta questão havia estado presente no magistério dos papas anteriores (como João XXIII, em “Pacem in terris”, ou a alocução de Paulo VI junto à ONU, em 1965), mas nunca com tanta determinação e força.

Procedente de uma Polônia dominada por dois regimes totalitários – o nacional-socialista, primeiro, e o comunista depois –, em João Paulo II a liberdade religiosa significava liberdade da pessoa frente à imposição exterior. Sua primeira encíclica, “Redemptor hominis”, já mencionava expressamente a liberdade religiosa.

No entanto, no final do seu pontificado, cada vez teve mais importância sua denúncia das ideologias laicistas. Coincidindo com a redação do projeto da nova Constituição Europeia (2004), na qual não eram mencionadas as raízes cristãs do continente (mas se mencionava o Iluminismo), o Papa falou várias vezes sobre a liberdade religiosa, também no sentido de não discriminação na sociedade.

Uma de suas últimas intervenções, em 24 de janeiro de 2005, dirigiu-se a um grupo de bispos espanhóis, a quem advertiu que o laicismo “leva gradualmente, de maneira mais ou menos consciente, à restrição da liberdade religiosa, a ponto de promover o desprezo ou a ignorância do âmbito religioso, encerrando a fé na esfera privada e opondo-se à sua expressão pública (…). Um conceito correto de liberdade religiosa não é compatível com esta ideologia, que por vezes se apresenta como a única voz da racionalidade. Não se pode limitar a liberdade religiosa sem privar o homem de algo que é fundamental”.

Bento XVI, durante os primeiros anos do seu pontificado, falou especialmente da “laicidade positiva”, ou seja, da necessidade de uma relação separada, mas de colaboração entre a Igreja e o Estado, como base da liberdade religiosa.

Retomando a linha das últimas intervenções de João Paulo II, durante os primeiros anos de pontificado, Bento XVI quis aprofundar na questão do laicismo como ameaça contra a liberdade religiosa, ao marginalizar as expressões públicas da fé.

Em duas históricas viagens realizadas em 2008, aos Estados Unidos (abril) e à França (setembro), o Papa proferiu vários discursos nos quais defendia a ideia de uma laicidade positiva, ou seja, a autonomia entre as esferas política e religiosa e sua necessária colaboração no âmbito social.

Concretamente, em seu discurso de resposta ao presidente Sarkozy, o Papa defendeu novamente a laicidade positiva, apropriando-se do termo empregado pelo presidente francês. O Pontífice explicou que as duas chaves para compreender o termo “laicidade positiva” são: que a prática da religião tem por natureza uma dimensão pública e que o Estado e as instituições religiosas têm como fim o bem da pessoa humana.

O acontecimento que permitiu que Bento XVI culminasse seu ensinamento sobre a laicidade positiva foi a comemoração do 80º aniversário da assinatura dos Pactos Lateranenses. Tais pactos permitiram a criação do Estado Cidade do Vaticano, promovendo a independência e a colaboração entre os poderes públicos da Igreja.

Outro momento importante deste ensinamento foi o discurso de Bento XVI no Westminster Hall de Londres, diante da classe política e cultural inglesa, em setembro de 2010, no qual pediu que não se marginalizasse a religião na vida civil.

Posteriormente, entre 2009 e 2012, o Papa insistiu especialmente na questão da liberdade religiosa, definida por ele como o primeiro dos direitos humanos. Sua mensagem central sobre o tema foi publicada em janeiro de 2010, poucos meses depois do Sínodo sobre o Oriente Médio.

O Sínodo do Oriente Médio, apenas um mês depois da visita do Papa à Inglaterra, destacou as graves dificuldades vividas pelas comunidades cristãs dessa região do mundo devido à falta de reconhecimento da liberdade religiosa. Esta situação se viu dramaticamente corroborada pelo atentado contra a igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro de Bagdá, em 31 de outubro de 2009, no qual 58 pessoas faleceram e dezenas ficaram feridas enquanto participavam da Missa. Este fato terrível foi um golpe para o mundo inteiro e um alerta sobre a situação das minorias cristãs em muitos países.

Algumas semanas depois, o Papa publicou sua mensagem para o Dia Mundial da Paz, dedicada inteiramente à questão da liberdade religiosa. Seu apelo se repetiu várias vezes em seus contínuos discursos de recepção aos novos embaixadores junto à Santa Sé, bem como no momento da apresentação de cartas credenciais, quando se tratava de diplomatas procedentes de países muçulmanos e asiáticos.

A questão da liberdade religiosa voltou a aparecer no encontro inter-religioso de Assis.

Em 9 de fevereiro de 2012, o Papa insistiu mais uma vez no tema, em seu tradicional discurso de começo de ano ao corpo diplomático.

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