Livros supostamente católicos estão vendendo uma visão da sexualidade que precisa de esclarecimentos“O sexo como vocês não conhecem: para cônjuges que amam a Deus” é um livro que a imprensa internacional batizou de “Kama Sutra católico”. Escrito pelo padre polonês Ksawery Knotz, este título e outros similares se tornaram sucessos de venda sem grande esforço publicitário em sociedades tão erotizadas como as ocidentais.
Os livros propõem a redescoberta de um importante “segredo” do amor no matrimônio: a integração entre a sexualidade e o bem da pessoa.
O padre Knotz é doutor em teologia pastoral e conta com o apoio da conferência episcopal polonesa, mas… não se atém estritamente aos âmbitos “doutrinal, pastoral e relacionado com a consciência”, como cabe ao seu ministério e como a doutrina da Igreja católica recomenda.
Ele faz o papel de médico, psicólogo e conselheiro matrimonial, sem ser nem médico, nem psicólogo, nem conselheiro matrimonial. Além disso, como escritor, usa de uma “liberdade literária” que o faz aparecer como “autoridade na matéria”, apesar da pouca novidade das suas afirmações.
Seu argumento “pastoral” é que, quando começou a trabalhar como assessor espiritual de casais, percebeu o “medo” com que alguns casais católicos viviam o sexo: como se fosse algo pecaminoso, sujo, vergonhoso.
Ora, mas a doutrina católica já diz claramente que a relação sexual no matrimônio “é uma necessidade, um bem e um valor”. O sexo é parte “constitutiva do sacramento”, a ponto de a Igreja católica declarar a nulidade dos casamentos em que não acontece a união sexual. Para a Igreja, as relações sexuais do casal são muito importantes para que os esposos melhorem o seu relacionamento, já que, quando falta esta intimidade, uma série de problemas pode surgir.
Além disso, a Igreja incentiva a boa formação de leigos no tema para prestarem aconselhamento e terapia de casal; leigos comprometidos com a fé, que exerçam essa missão também da perspectiva da própria experiência matrimonial, capazes de esclarecer qualquer dúvida em favor do matrimônio e da família.
A grande verdade moral (que não é nenhuma novidade) é que, no autêntico amor entre esposos, o sexo é um reduto fisiológico em que todas as expressões que levam à intimidade realizadora são válidas quando vividas sem falsificações que prejudiquem o seu caráter unitivo e procriativo; quando promovem a dignidade da pessoa na visibilidade do seu corpo; quando são a “celebração” de uma vida de esforçada fidelidade.
O sexo no matrimônio faz parte do plano de Deus e, portanto, é bom e santo. Sendo as relações sexuais uma linguagem com que os esposos expressam sentimentos, paixões e afetos, elas são uma espécie de “cereja do bolo”.
A sexualidade se integra no bem da pessoa casada: o amor se expande livremente numa ampla e profunda relação que exige entrega gozosa, abnegação e dom de si mesmo ao outro em meio a todas as circunstâncias da vida. Um amor que se reveste de delicadezas e atenções à pessoa amada, no desejo de vê-la desenvolver-se e ser feliz.
Knotz pretende oferecer respostas e soluções que estão implícitas na sadia relação pessoal de quem consegue integrar a sua sexualidade como um bem, livrando-se da escravidão do egoísmo e permitindo-se crescer no domínio e na responsabilidade sobre si mesmo ao entregar-se como o mais nobre presente à pessoa amada. Este é que é o verdadeiro segredo do amor!
Muitos casais se perguntam: “O que podemos fazer e o que não devemos fazer? Qual é o limite? Se ambos permitimos e queremos, qual é o problema?”.
Há estímulos válidos e compatíveis com uma vida em graça, com a verdadeira comunhão entre um homem e uma mulher que se amam: música, vinho, ambientação… Aliás, essa bela dimensão do estímulo à intimidade do casal deve ser cuidada com esmero. O risco é o exagero de incentivos ao mero instinto sexual, que oculta o egoísmo da autossatisfação. Esse egoísmo impede a plena entrega de um para o outro e, mais ainda, o acolhimento do outro: em maior ou menor grau, um dos dois se sentirá usado, instrumentalizado, e um ato que deveria ter sido unitivo se torna o contrário: um ato de exploração, que vai se transformar em ressentimento na menor das crises matrimoniais.
Knotz vai vender muitos livros em nossa sociedade erotizada. E passará o tempo e virão outros mais audazes, que tentarão impregnar de suposta racionalidade as paixões e a sensibilidade humana, fazendo da intimidade no matrimônio algo cada vez mais trivial ao separar “doutoralmente” a sexualidade do amor, tornando-a objeto de comércio.
Potencializa-se, assim, o risco de reduzir o matrimônio a uma questão “erótica” – e isso não é matrimônio. Dizia o então cardeal Joseph Ratzinger: a sexualidade foi trivializada, banalizada, porque se reduziu ao prazer; mas a sexualidade é um mistério muito grande, porque é um projeto de Deus de criar o ser humano para o amor; é um modo de participar da realidade de Deus!