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O católico e a greve

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Vanderlei de Lima - publicado em 03/06/18
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É preciso ponderar muito bem os benefícios e os prejuízos ao bem comumEntende-se por greve a paralisação premeditada e sistemática do trabalho em vista de reivindicar direitos.

Sua origem, no modelo hoje conhecido, está nos ambientes comunistas do século XIX. Georges Sorel, engenheiro francês, julgava que a revolução social só se faria se fosse incutido no proletariado um entusiasmo semelhante ao das grandes campanhas bélicas. Ora, a campanha bélica oportuna no caso, pensava ele, seria a tática das greves: “Só há uma força que possa hoje em dia produzir esse entusiasmo sem o qual a moral não é possível: é a força que resulta da propaganda em favor da greve geral” (Réflexions sur la violence. Paris, 388, apud E. Bettencourt, OSB. Curso de Doutrina Social da Igreja. Rio de Janeiro: Mater Ecclesiae, 1992, p. 189). É um excelente instrumento de agitação social que pode favorecer a grupos baderneiros ou criminosos.

A Igreja, todavia, não é, em princípio, contrária à greve, desde que ocorra dentro do respeito à moral, conforme nos ensina – sintetizando a Moral Católica – Dom Estêvão Bettencourt. Diz ele: “A Moral católica reconhece o direito de greve na base dos seguintes princípios: a) Há inegavelmente situações em que o trabalhador sofre injustiça (salário insuficiente, número excessivo de horas de trabalho, falta de garantias etc.). b) Diante dessas situações, o cristão não tem a obrigação de cruzar os braços; ao contrário, incumbe-lhe o dever de procurar restabelecer a justiça. c) Em vista disto, recorrerá às autoridades e instâncias constituídas oficialmente para remediar tais males. Acontece, porém, frequentemente, na vida moderna que este recurso não é possível ou, caso seja possível, não é eficaz, nada alcança. d) Dada esta ineficácia, a Moral católica reconhece ao trabalhador o direito de greve, desde que se preencham as quatro seguintes condições: – o objetivo visado pelos grevistas deve ser realmente justo; – conste que tal objetivo não pode ser atingido por outra via, menos violenta; – haja fundada esperança de que o movimento grevista logre êxito; – exista proporção entre o bem ou os bens que se visam mediante a greve, e os males que a mesma não pode deixar de acarretar para os indivíduos e a sociedade. Em outros termos: os resultados bons devem poder compensar os danos provocados pelo movimento. Em tais circunstâncias, a greve será legítima” (idem).

Disso se segue que é preciso ponderar muito bem os benefícios e os prejuízos ao bem comum. Por exemplo: a greve vai ajudar ou prejudicar a população em geral? Como será a vida da comunidade durante e depois da greve? É reivindicação pura de uma categoria de legítimos trabalhadores ou estes são mera massa de manobra nas mãos de líderes perversos e, portanto, inescrupulosos com interesses escusos? Quem, realmente, lucra com a confusão causada por uma greve de grandes proporções?

A moral católica reconhece também o direito dos grevistas de tentarem cooptar mais pessoas para o movimento, desde que tal cooptação seja esclarecida e livre da parte de quem é abordado. A partir do momento em que se usa a coação física e o outro fica impedido de agir livremente ou há sabotagem e depredação de bens públicos e/ou particulares, a greve perde sua legitimidade e torna-se pecado.

Daí o alerta do Papa Leão XIII: “Não raro o trabalho excessivamente prolongado ou penoso e o salário tido como insuficiente provocam essas interrupções de atividade organizadas às quais se dá o nome de greves. Toca aos poderes públicos proporcionar remédio a praga tão comum e, ao mesmo tempo, tão perigosa, pois as greves implicam em detrimento não só para os patrões e os próprios operários, mas também entravam o comércio e prejudicam os interesses comuns da sociedade; já que facilmente degeneram em violências e tumultos, a tranquilidade pública é muitas vezes por elas comprometida. É mais eficaz e salutar que as leis, com a sua autoridade, de antemão cortem o mal e o impeçam de se produzir, removendo com sabedoria as causas que pareçam aptas a excitar conflitos entre operários e patrões” (n. 24; cf. também Laborem Exercens, n. 20).

Eis material para reflexão serena e ponderada nestes dias atravessados pelo Brasil a fim de que católicos e demais pessoas de boa vontade formem sua opinião.

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