Um debate em torno da hipótese de Nossa Senhora ser, solenemente, definida como Corredentora da humanidadeO bispo de Getafe, Dom Ginés García Beltrán, apresentou, recentemente, na paróquia de Santa Maria Maravilhas de Jesus, na Espanha, o Fórum Diocesano Mariano. Um dos pontos do evento é promover um debate em torno da hipótese de Nossa Senhora ser, solenemente, definida como Corredentora da humanidade. Dado que o tema sempre volta à baila, proporemos, em uma série de quatro artigos, em forma de perguntas e respostas, a temática a fim de orientar clérigos e leigos interessados.
Qual é o objetivo deste artigo? – O objetivo deste artigo é apresentar – com base em Pergunte e Responderemos (PR) n. 425, outubro de 1997, p. 445-450 – aspectos do debate teológico promovido por um grupo de Bispos que deseja obter da Igreja a definição solene de Maria Santíssima como Medianeira, Corredentora e Advogada do gênero humano.
Em que períodos essa corrente foi mais forte? – Essa corrente foi mais forte, especialmente nos anos antecedentes ao Concílio Vaticano II (1962-1965), ou seja, entre 1959 e 1962, por meio de petições diretas de 256 Bispos desejosos de ver proclamado o dogma da “Mediação universal de Maria Santíssima”, além de outros 48 Bispos que pediam a mesma coisa, mas com uma ressalva: “se fosse considerado oportuno”.
A mesma discussão foi retomada, na década de 1990, sobretudo a partir de 1996, com a publicação do livro Mary: coredemptrix, mediatrix, advocata, do Prof. Mark Miravalle, da Universidade Franciscana de Steubenville, em Ohio (Estados Unidos). Tal obra – que tem o prefácio de apoio do Cardeal Edouard Gagnon, defensor da proclamação de mais esse dogma mariano – era, na época, porta-voz de cerca de 40 Cardeais e 500 Bispos (cf. PR, p. 447 e 445).
Como seria definida essa nova fórmula dogmática? – O Prof. Miravalle propõe a seguinte formulação dogmática: “A Corredenção de Maria é aquele privilégio pelo qual a Imaculada sempre Virgem Mãe de Deus cooperou livremente com e sob Jesus Cristo, seu Filho e Redentor, na Redenção histórica da família humana, desde o seu Fiat na Anunciação até o sacrifício do seu coração materno no Calvário; e assim Maria se tornou para nós a Medianeira de todas as graças da Redenção e Advogada do Povo de Deus” (PR, p. 445).
Como se fundamentaria na Tradição o dogma da corredenção de Maria? – Miravalle cita textos patrísticos e, entre outros, um sermão de S. Cirilo de Alexandria (+ 444), que dizia: “Salve Maria, Mãe de Deus (Theotókos), venerável tesouro do mundo inteiro, é por meio de vós que a Ssma. Trindade é adorada e glorificada”. Cita, outrossim, o teólogo russo Sérgio Bulgakov, que escreveu: “A fé em Cristo que não inclua o seu nascimento virginal e a veneração de sua mãe é uma outra fé, é outro Cristianismo diferente do da Igreja Ortodoxa” (PR, p. 446).
Na história, qual seria a importância desse dogma para os dias de hoje? – Para Miravalle a importância atual do dogma é mostrar à humanidade que quem sofre participa, hoje, dos sofrimentos de Cristo, Nosso Senhor, colaborando, assim, com a obra redentora de Jesus. Seria uma oportuna palavra de reconforto aos sofredores de nosso tempo. Eis sua fala: “O exemplo de Maria Corredentora diz à Igreja e ao mundo que o sofrimento é corredentor. Isto tem imediato significado para as tragédias do aborto e da eutanásia, recursos estes que, cada qual a seu modo, negam os efeitos fecundos do sofrimento”.
E mais: O teólogo norte-americano amplia sua visão – juntamente com o teólogo anglicano (ramo cristão dissidente da Igreja Católica a partir do século XVI na Inglaterra) John Maquarre – ao defender que a definição da livre participação de Maria na obra redentora daria uma resposta ao determinismo (sistema filosófico que nega a influência pessoal sobre a determinação de alguém) professado por Lutero e Karl Barth, assim como pelos materialistas totalitários de direita e de esquerda: a livre cooperação da Virgem Santíssima seria paradigma da liberdade com que todos os homens podem (e devem) responder ao chamado de Deus, cumprindo a missão a eles confiada. Maria é o símbolo da perfeita harmonia que deve existir entre a vontade de Deus e a resposta dos homens ao plano do Pai (cf. PR, p. 446).