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Um relacionamento “com os olhos vendados”

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Juan Ávila Estrada - publicado em 28/11/20
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As pessoas perdem cada vez mais o pudor diante da nudez física, mas têm cada vez mais dificuldade em mostrar-se como realmente são por dentroEm muitas culturas dos séculos passados (e algumas atuais), os relacionamentos entre esposos eram estabelecidos por pactos dos pais dos noivos e/ou pelas convenções do Estado, do clã ou da família. O importante naquela época não era amar, nem sequer conhecer a pessoa com a qual se conviveria para sempre; o importante era fortalecer os Estados, garantir a estabilidade do clã ou salvar uma família da ruína.

A partir do século XIX, a relação entre esposos mudou um pouco, com a chegada da Revolução Industrial, e começou a ser antecipada por uma etapa prévia que conhecemos hoje como “namoro”.

Hoje, existe a possibilidade de escolher a pessoa com quem se quer casar, conviver com ela, conhecê-la, para descobrir, muito além do enamoramento e dos interesses ocultos, se essa pessoa se aproxima do que se espera de um cônjuge.

O perigo dos estilos de “escolha” está em que também o namoro poderia estar amarrado à cegueira voluntária. Na primeira forma, chega-se “cego” ao casamento, pois só no dia da cerimônia as pessoas conhecem com quem se casarão. Como será? Como agirá? Conseguirei amá-lo(a)?

No segundo estilo, quando o enamoramento está acima do amor verdadeiro, tende-se a cobrir ou ignorar todos os defeitos que saltam à vista, mas que, no atual estado de êxtase, a pessoa é incapaz de reconhecer; ou seja, muitos estabelecem relacionamentos cegos, nos quais, ao invés de conhecer-se melhor, simplesmente observam o que querem, o que lhes agrada, o que lhes convém, para poder se apegar ao que chamam de “amor”.

O namoro e o enamoramento mal conduzidos tendem a ser como binóculos: de um lado, maximizam as virtudes e, do outro, minimizam os defeitos.

Neste sentido, a pessoa tende a ter uma enorme “deficiência visual” para captar adequadamente o outro como ele é, sobretudo quando tal afeto é filtrado pelas próprias razões, que “a própria razão desconhece”.

Risco

Se a isso acrescentamos uma vida sexual ativa entre os namorados, o risco é maior ainda, já que o sexo tem poder apreensivo e de alteração da consciência, e pode construir a relação sobre falsos conceitos do outro ou sobre fracas experiências físicas.

A enganosa miragem de uma vida sexual prazerosa e plena pode fazer a pessoa acreditar que esta é suficiente para o casamento e o amor.

No entanto, é preciso saber captar outros elementos que, se não existirem, tornarão impossível o dom de si ao outro. Não se pode chegar ao casamento unicamente conhecendo o agir sexual da pessoa, mas sem saber como ela se relaciona com sua família, seus amigos, o trabalho, o dinheiro, a frustração, a dor, a doença etc.

O verdadeiro conhecimento não pode acontecer somente pela nudez do corpo, mas pelo dom de poder ser você mesmo diante da outra pessoa, e ser amado como tal. O dom de si não acaba na genitalidade, pois a compatibilidade sexual não garante um amor estável.

Como namorados, é importante conhecer-se vestidos, mas despidos de preconceitos, de vendas emocionai, para poder chegar ao sacramento do matrimônio com a certeza de ter dado um passo seguro diante daquela pessoa que se escolheu, apesar dos seus defeitos.

As pessoas perdem cada vez mais o pudor diante da nudez física, mas têm cada vez mais dificuldade em mostrar-se como realmente são por dentro. Cobrem suas emoções, ocultam seus sentimentos, calam sua dor.

Por isso, encontramos casais que são excelentes amantes, porém maus esposos; o único lugar em que são felizes é na cama, mas, fora dela, é tudo um desastre.

O amor verdadeiro não é frio nem calculador, mas sabe ponderar tudo, sem maximizar nem minimizar nada; sabe aquilo com que é capaz de lidar ou não, mas sobretudo não espera ingenuamente mudar a outra pessoa.

É absolutamente indispensável que haja um conhecimento o mais profundo possível da outra pessoa. E não pode haver mentiras em um relacionamento que caminha rumo ao matrimônio, já que a convivência sempre acabará tirando a venda dos olhos e, irremediavelmente, cada um será revelado como é na verdade.

Não podemos ocultar para sempre o que somos.

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