A frase que dá título a esse artigo foi pronunciada pelo Papa Francisco em duas ocasiões recentes, ao falar da proposta do Pacto Educativo Global (num seminário da Pontifícia Academia de Ciências e num encontro com jovens). Não é um pensamento óbvio. Quando pensamos em educação, vem-nos à mente o aprendizado, a erudição, a eficiência, os valores morais... Mas a beleza parece mais um adereço, desejável, mas dispensável. Parece-nos mais uma preocupação de jovens eufóricos, na flor da idade, do que de um ancião experiente, com o corpo castigado pelos anos.
A beleza aponta o bem e a verdade
Por que Francisco insiste tanto na importância da beleza para a educação? Essa insistência pode nos parecer estranha porque temos uma visão adulterada da beleza. Assim como o amor, também ela foi reduzida a um fenômeno instintivo, marcadamente sensorial, um prazer que pode vir ou não vir, um “a mais” que excita os sentidos e traz prazer. Se a beleza fosse só isso, realmente não precisaríamos dela no processo educativo, pois ela no máximo serviria para reduzir um pouco a fadiga inevitável a qualquer trabalho.
Acontece que a beleza é um dos sensores mais eficientes que dispomos para perceber quando encontramos a verdade e o bem aos quais buscamos. Não qualquer verdade ou qualquer bondade, mas aquelas que correspondem ao mais profundo do nosso ser, aquelas que nos fazem dizer “vale a pena sacrificar o restante da vida por essa experiência”. Quando nos deparamos com a beleza, intuímos que alguma coisa de importante e desejável está próxima.
O esteticismo reduz essa experiência à mera contemplação das formas, desvinculando-as da realidade mais profunda que evocam. A beleza de uma pessoa nos remete a uma série de anseios humanos: de perfeição, de acolhida, de afeto, de transcendência. Nos habituamos, contudo, a olharmo-nos vendo apenas os aspectos mais superficiais dessa experiência da beleza. Mas Deus mantém sempre ao menos uma centelha de verdade acesa no coração humano. Por isso, ao ouvir o convite do Papa, de praticar uma educação que leve à beleza, todos se encantam.
Aqui, um pequeno parêntese: então por que existem tantas obras de arte que nos parecem feias, agressivas, violentas? A arte (que é uma tentativa de expressar a beleza, mas não a beleza em si) revela o que vai pelo coração da pessoa. Um coração amargurado e uma experiência de sofrimento também se revelam por ela. Porém, nesses casos, temos que ver a beleza do bem pela antítese do que está mostrado, como os negativos das fotos antigas mostravam a imagem, mas com as cores trocadas. A exposição da feiura é sempre um grito de denúncia, uma declaração de busca por ternura e beleza, mesmo quando aquele que expõe não se dá conta disso. Nesse caso, nosso amor deve ser ainda maior, para entender os sinais invertidos, a feiura inevitável, e descobrir até mesmo aí o traço inconfundível da beleza.
A beleza já está em nós e nos impulsiona a agir com amor
Quem acompanha as palavras e os gestos de Francisco, percebe claramente a importância que ele dá à beleza, ao fascínio perante a realidade. Os que encontram a beleza não conseguem afastar-se dela. A ternura, o cuidado, o amor são todos aspectos do bom e do verdadeiro, por isso estão em continua interação com a beleza. O belo nos convidar a amar, a sermos bons e ternos, a cuidar dos demais. Já o amor, a ternura e o cuidado, quando vivenciados, se mostram como beleza.
O Papa lembra que a verdadeira beleza não é autocentrada, nem pactua com o mal. Essa beleza verdadeira já está presente no coração humano, foi dada por Deus quando nos fez à sua imagem. Nosso dever é cultivá-la e protegê-la, pois sem dúvida ela é ameaçada na realidade cotidiana. Nesse sentido, todo processo educativo integral leva a uma descoberta da beleza contida no mundo e em nós mesmos. Objetivamente, estamos muito longe disso, mas a família e a escola, ao educar, cada uma em seu âmbito próprio, deveriam nos levar ao fascínio crescente pela vida.
Continua Francisco: “a beleza que Jesus nos revelou é um esplendor que se comunica, que age; uma beleza que se encarna para ser compartilhada; uma beleza que não tem medo de se sujar, de se desfigurar para ser fiel ao amor de que é feita”. A beleza, na visão do Papa, nos impulsiona a um agir por amor. Por isso, ele espera que os jovens tenham “uma saudável inquietação nos desejos e nas intenções, essa inquietação que sempre o impele a caminhar [...] Defendendo a beleza marcada de tantos párias do mundo; abrindo-se para acolher os outros, especialmente os mais vulneráveis e marginalizados; olhar para o outro, diferente de nós, não como uma ameaça, mas como uma riqueza. E também defendendo a beleza ferida da criação, protegendo os recursos da nossa casa comum, adotando estilos de vida mais sóbrios e amigos do ambiente”.
Essas palavras foram dirigidas aos jovens, mas podem e devem encantar também os adultos – e até os velhos – pois seria ideal se pudéssemos sempre testemunhar aos mais jovens a força da beleza e do amor.