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O hexaémeron, Adão e Eva e a Igreja

bíblia
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Vanderlei de Lima - publicado em 29/01/23
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Com relação a Deus, os primeiros capítulos do Gênesis querem ensinar algo importante

Chama-se hexaémeron a obra dos seis dias da criação, conforme descrita no livro do Gênesis 1-3. Aí estão presentes Adão e Eva como nossos primeiros pais e prefiguras de Cristo (o novo Adão) e da Virgem Maria (a nova Eva). Analisemos!

Antes do mais, notemos que, segundo o Gênesis (Gn), Deus cria o mundo em seis dias e descansa no sétimo. Longe de querer propor algo científico, o objetivo dos referidos capítulos é oferecer um ensinamento religioso. Sim, ocorrem aí os números 6 + 1 = 7, ou seja, tudo o que Deus criou é perfeito (7 é o número da perfeição). Mais: as criaturas só ganham perfeição (7) quando juntam o seu ser criado (6) ao dia do Senhor, o Criador (1). Disso decorrem as demais lições a respeito de Deus, do mundo e do ser humano.

Com relação a Deus, os primeiros capítulos do Gênesis querem ensinar que: 1) não há vários deuses, como acreditavam os povos caldeus, cananeus e egípcios, mas um só Deus criador de tudo. 2) Deus é eterno (sem começo nem fim), já o mundo é temporal. 3) Deus é todo-poderoso, faz tudo por meio de sua palavra. 4) Deus é bom e, por isso, tudo o que criou também é bom. O mal só entrou no mundo como consequência do pecado ou do não que o ser humano disse ao Criador (cf. Gn 2,4b-3,24). 5) Deus descansou do seu trabalho criador no sétimo dia. Ora, há aqui um forte antropomorfismo (atribuir a Deus certas características humanas). Com efeito, Deus – o perfeito, absoluto e eterno – não se cansa; portanto, não necessita de repouso, mas o ser humano sim. Daí a lição ser a que segue: as criaturas só repousam verdadeiramente em Deus e hão de ter, na semana, um dia para descansar e cultuar ao Senhor.

Com relação ao mundo, o primeiro livro da Bíblia quer ensinar três lições: a) ele não é eterno, mas, ao contrário, teve início por obra de Deus; b) não é fruto do acaso, mas da livre e soberana ação do Senhor e c) todas as criaturas são boas, pois assim foram criadas por Deus e são por ele sustentadas. Não há destino cego a reger o universo.

Com relação ao ser humano, o Gênesis ensina o seguinte: 1) o homem e a mulher constituem algo novo entre os demais seres. São como que uma síntese da criação, pois têm corpo material, como os demais seres infra-humanos, mas também possuem algo de imperecível como os anjos, isto é, a alma espiritual. 2) tanto o homem como a mulher são iguais em dignidade, pois foram feitos à imagem e semelhança de Deus. 3) o matrimônio entre um homem e uma mulher, seres complementares, é santo (cf. Gn 1,28). 4) o trabalho é abençoado por Deus, pois, por meio de suas atividades lícitas, o ser humano continua a obra divina e serve de elo entre o Senhor e as criaturas infra-humanas. 5) o sétimo dia é santo (cf. Gn 2,3) ou reservado a Deus no repouso semanal, prefigura do repouso celeste (cf. Hb 3,4-11). Se o homem do Antigo Testamento descansava no sábado (coroamento da Criação), o Novo Testamento desloca esse dia festivo para a obra da recriação ou da ressurreição, no domingo: o primeiro dia da semana (cf. 1Cor 16,6-7; At 20,7; Ap 1,10).

Passamos, agora, ao segundo ponto: Adão e Eva realmente existiram? – A resposta a essa pergunta é sim. Eles são personagens históricos e não mitos. Apesar de o nome Adam designar homem em geral (cf. Gn 1,27) e Eva significar mãe de todos os viventes (cf. Gn 3,20), “é falso dizer que Adão e Eva nunca existiram ou que são mero artificio literário. São tão reais quanto o gênero humano é real. O texto sagrado nos diz que Deus tratou com o homem nas suas origens,… com o homem real, e não com um ser fictício. E a história referente aos primeiros pais é história real, embora narrada em linguagem figurada (serpente, árvore, fruta…)” (Dom Estêvão Tavares Bettencourt, OSB. Curso de Antropologia Teológica. Rio de Janeiro: Mater Ecclesiae, 2017, p. 155).

Negar a existência real de Adão e Eva é, de certo modo, negar a obra redentora de Cristo (cf. Rm 5,12-20), conforme ensina o Papa São Paulo VI ao afirmar que “o mistério do pecado original está intimamente ligado ao mistério do Verbo Encarnado, salvador do gênero humano, com sua paixão, morte e gloriosa ressurreição e, portanto, também com a mensagem de salvação confiada à Igreja Católica” (Discurso de 11/07/1966) e o papel singular da nova Eva, Maria Santíssima, a Mulher por excelência (cf. Gn 3,15 Ap 12).

Que estas colocações possam despertar reflexões nos leitores.

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