Os "Loucos de Deus" ou "Bobos de Deus" constituem uma especial categoria de santos que são peculiares ao cristianismo ortodoxo. Normalmente vestidos como mendigos e comportando-se de maneira não convencional, desafiando ou ridicularizando o status quo, os "Loucos de Deus" são ao mesmo tempo desprezados e reverenciados. Nas palavras de Anastasija Ropa, um "Louco de Deus" é "um bufão e um vidente ao mesmo tempo". Ela explica:
"O comportamento deles […] tinha uma lógica subjacente inacessível aos não iluminados: para usar apenas um exemplo, cuspir nas paredes das igrejas é uma blasfêmia, enquanto beijar as paredes dos bordéis parece ser repulsivo. Mas a razão desse comportamento aparentemente ilógico é simples: quando as pessoas rezam, os demônios se afastam delas e ficam do lado de fora das paredes da igreja, mas quando as pessoas bebem nos bordéis, os seus anjos ficam do lado de fora e choram. Os Loucos de Deus são aqueles que veem algo que os outros não veem, e, pelo seu comportamento aparentemente ilógico, apontam o dedo para deficiências espirituais, morais ou sociais".
Nicolau “Konchanov” (ou seja, “Cabeça de repolho”), de Novgorod, na Rússia, foi um desses "bobos" ou "loucos". Nascido de uma família rica e ilustre no século XIV, Nicolau amou a piedade desde muito jovem, jejuando e orando. Conforme ele crescia em virtude, o povo de Novgorod começou a admirá-lo. Desprezando o louvor dos homens, Nicolau se dedicou à difícil empreitada da "loucura por causa do Senhor". Os hagiógrafos explicam que ele percorria a cidade vestido em farrapos, tanto no frio intenso do inverno russo quanto no calor implacável do verão, suportando espancamentos, insultos e zombarias.
Pode-se pensar que Nicolau de Novgorod é retratado segurando um repolho na mão porque era tudo o que ele tinha para comer. Sendo ele um asceta, até faria sentido essa interpretação, mas o motivo real é bem diferente.
Nicolau não era o único "Louco de Deus" em Novgorod. Teodoro de Novgorod, o Justo, também foi um deles. Em direta menção à inimizade e ao conflito entre os moradores dos bairros de Torgov e de Sophia, ambos em Novgorod, Nicolau e Teodoro fingiram ser inimigos irreconciliáveis. Ao agirem assim, eles pretendiam mostrar ao povo de Novgorod a estupidez da sua mesquinha luta destruidora.
Quando Teodoro tentava cruzar a ponte do rio Volkhov para o lado de Sophia, Nicolau o empurrava de volta para o lado de Torgov. Teodoro fazia a mesma coisa quando Nicolau cruzava para o lado de Torgov. Assim, embora espiritualmente concordassem um com o outro, eles lembravam ao povo de Novgorod, com o seu comportamento incomum, a loucura da sua própria inimizade.
Num incidente, tendo vencido Teodoro, Nicolau caminhou sobre as águas do rio como se estivesse em terra seca e jogou uma cabeça de repolho em Teodoro. Foi assim que ganhou o apelido de "Konchanov", ou "Cabeça de Repolho".
Quando morreu, em 1392, Nicolau foi enterrado no final do cemitério perto da catedral de Yakovlev. Suas relíquias repousam hoje sob uma cripta na igreja do Grande Mártir Panteleimon, que foi construída sobre o seu túmulo.