Comento, neste artigo, partes do excelente trabalho “Incremento da capacidade de resposta e sobrevivência em ataques ativos”. Escrito por Valmor Saraiva Racorti, coronel da PMESP, e por Adriano Enrico Ratti de Andrade, capitão da PMESP, ambos instrutores pela Universidade do Texas/Programa ALERRT, foi publicado no site Velho General, em 20 de maio último, e merece ampla divulgação.
Os competentes autores iniciam explicando a razão da mudança de nomenclatura de “atirador ativo” (restrita a armas de fogo), em 1999, para “autor de ataque ativo” (mais abrangente, visto que tais ataques podem ser realizados com facas, explosivos, veículos etc.). Dizem Racorti e Ratti que o ataque ativo pode “ser entendido como um incidente crítico dinâmico em que um ou mais indivíduos, estão ativamente motivados a matar indiscriminadamente o maior número possível de pessoas em determinado local, podendo fazer uso de quaisquer meios à sua disposição”.
Quem pode realizar esse tipo de ataque? – É difícil ou quase impossível responder, de modo decisivo, a questão proposta. Todavia, os oficiais da PMESP demonstram, uma vez mais, sua perícia no assunto ao registrarem que: 1) Na “maioria dos casos, os agentes deste tipo de ataque se inspiram em ataques pretéritos”, ou seja, imitam indivíduos que os antecederam em atos semelhantes e 2) “Não há um perfil pronto para fácil detecção precoce do causador deste tipo de incidente, porém grande parte possui traços de psicopatia ou doenças mentais que afetam sua capacidade de percepção da realidade”.
Conceitos básicos
É inevitável relembrar, aqui, alguns conceitos básicos de transtornos mentais e psicopatia. O psicopata não é, como o nome pode sugerir, um doente mental. Isso o explica a psiquiatra Dra. Ana Beatriz Barbosa Silva: “A palavra psicopata literalmente significa doença da mente (do grego, psyche = mente; e pathos = doença). No entanto, em termos médico-psiquiátricos, a psicopatia não se encaixa na visão tradicional das doenças mentais. Esses indivíduos não são considerados loucos, nem apresentam qualquer tipo de desorientação. Também não sofrem de delírios ou alucinações (como a esquizofrenia) e tampouco apresentam intenso sofrimento mental (como a depressão ou o pânico, por exemplo). Ao contrário disso, seus atos criminosos não provêm de mentes adoecidas, mas sim de um raciocínio frio e calculista combinado com uma total incapacidade de tratar as outras pessoas como seres humanos pensantes e com sentimentos” (Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. 3ª ed. Rio de Janeiro: Principium, 2018, p. 42).
Daí o Dr. Guido Palomba, psiquiatra forense, afirmar que o psicopata habita a zona fronteiriça entre a loucura e a normalidade. Entre a noite (a doença mental) e o dia (a normalidade) há a aurora (a psicopatia). Portanto, ele não é nem doente, nem normal, mas um transgressor (cf. Vanderlei de Lima. Psicopatas: quem são? Como agem? Que fazer com eles? São Paulo: Ixtlan, 2020, p. 13 e 15). Aqui cabem duas máximas: 1) “Nem todo delinquente é psicopata, mas todo psicopata é delinquente” e 2) “Nem todo egocêntrico é um psicopata, mas todo psicopata é egocêntrico”. Ele não olha para os outros na horizontal (“somos iguais”), mas na vertical (“sou superior a todos”).
A título de conclusão, citamos – sobre os transtornos mentais graves – Harold Schechter, em sua linguagem um tanto freudiana, quando escreve que “a psicose é definida como um transtorno mental grave, caracterizado por certo grau de deterioração da personalidade. Psicóticos vivem em um mundo de pesadelo criado por eles mesmos. Sofrem de alucinações e delírios – ouvem vozes, têm visões, estão imbuídos de crenças bizarras. Eles perderam o contato com a realidade. Ao contrário dos psicopatas – que parecem ser pessoas normais e racionais mesmo enquanto levam vidas secretas grotescas –, os psicóticos correspondem à concepção geral de loucura. As principais formas de psicose são a esquizofrenia e a paranoia” (Serial killers. Anatomia do mal. Rio de Janeiro: DarkSide Books, 2013, p. 29). Estes perturbados mentais – frise-se – raramente cometem crimes graves (cf. Carlos Eduardo Garcia in Mente que mata, Superinteressante, 31/10/2016, online). Vale a pena ler com vagar o artigo dos amigos Racorti e Ratti!