O ator fica na frente da câmera, tenta controlar seus movimentos. Às vezes, a equipe tem que fazer uma pausa para ele tomar comprimidos e se acalmar. O ator explica os detalhes de seu presente e seu passado e enfrenta a análise de quem está e estará olhando para ele, sem se preocupar que vejamos que ele parece velho, destruído por dores corporais das quais nem reclama.
No início do documentário, alguém pensou que o protagonista de "De Volta para o Futuro" não apareceria mais nas entrevistas devido à sua deterioração (caso você não saiba, ele sofre de mal de Parkinson desde os 30 anos de idade). Mas ele apareceu. Ele não tem medo do que eles vão dizer. Dos julgamentos, das críticas.
Mesmo atordoado, Michael J. Fox anda pela rua, tropeça devido aos tremores e cai no chão no meio da calçada, após cumprimentar um admirador. É um dos maiores exemplos de coragem, bravura e resistência que já vimos. As pessoas, quando atormentadas por uma doença, por qualquer doença, se escondem. Michael J. Fox, não.
A luta contra a doença
O documentário "Still" baseia-se nos seus livros autobiográficos. É, portanto, uma síntese e uma atualização deles. Mas ver o sofrimento do ator nas imagens acaba sendo mais doloroso.
Durante 90 minutos, assistimos a um resumo de sua vida, que inclui uma infância cercada de valentões e bullying por ser baixinho, seus primeiros passos na televisão, seu período de desemprego, o esforço brutal que ele fez filmando "Family Ties" durante o dia e "De Volta para o Futuro" à noite, o reencontro com aquela que seria sua esposa e companheira inseparável (Tracy Pollan), o nascimento dos filhos, a chegada do Parkinson, os períodos em que se afogou no álcool para esquecer o diagnóstico e, por fim, a aceitação e o reconhecimento público da doença e sua forma de lidar com ela.
Cruzando o limiar da vida adulta
Desde criança, como confirmado em uma das entrevistas, ele sentia a necessidade de fazer as pessoas rirem. É um menino que soube progredir, transformando seus complexos em armas cômicas. Agora, ele é um homem que usa as mesmas ferramentas. Quando o vemos com os filhos, com o médico ou com o entrevistador… ele acaba por fazê-los rir. O fato de um sujeito tão doente e machucado provocar risos em quem conversa com ele é uma verdadeira lição de vida. De não desistir, de não cair.
Mesmo ao rever algumas das pancadas e consequentes fraturas que sofreu, ele encontra espaço para o humor. Ele diz ao entrevistador que cair da própria altura, mesmo sendo baixinho, também dói. Só o vemos desmoronar uma vez, quando relê o trecho de uma de suas memórias em que narra a trajetória do pai até a morte.
Responsabilidade
“São apenas três sentenças, mas pesam cerca de dez toneladas”, diz entre lágrimas. Foi o primeiro passo para a realidade, o momento em que cruzou o limiar da vida adulta. Não se tratava mais de fãs pedindo autógrafos, estreias de filmes lotadas de admiradores e jornalistas, carros novos e mansões: tudo isso ele agora considera como algo ficcional.
A realidade era outra: a perda do pai, o diagnóstico precoce, o poço sem fundo do alcoolismo... Então ele descobriu a "vida". Para ele, sofrer de Parkinson em uma idade tão jovem era o preço a pagar por alcançar tanto sucesso e em uma idade tão jovem.
Como se fosse o Homem-Aranha ("com grandes poderes vêm grandes responsabilidades"), ele ainda sente a sobrecarga de ser Michael J. Fox: "As pessoas me dizem que eu as faço se sentirem melhores e as motivo a fazer coisas que, de outra forma, não fariam. E isso é a coisa mais poderosa que você pode sentir - e é também uma grande responsabilidade".
Enfim, a força, a resistência, a devoção à família, o empenho para angariar fundos para a pesquisa da sua doença e, sobretudo, a sua vontade de esgotar a vida até à última gota, são grandes exemplos que Michael J. Fox nos oferece.
O documentário está disponível na Apple TV.