Um dos muitos momentos de risada em O Código dos Woosters é quando Bertie Wooster opina ao seu mordomo: “Há momentos, Jeeves, em que alguém se pergunta: 'As calças importam?'”
Sempre adorei assistir à essa séries de televisão. Em primeiro lugar porque ela é hilária, e também porque gosto de ver como estão todos vestidos. Por exemplo: ternos, gravatas-borboleta e chapéus criam um ar de gentileza e cultura em torno de Wooster enquanto ele avança pela vida. É ótimo ver que vestir-se bem não significa arrogância, mas sim parte de uma herança cultural.
É claro que, hoje em dia, um olhar para as pessoas no supermercado deixa bem claro que a nossa atual tendência social não é vestir-se bem. Jeeves ficaria extremamente desapontado conosco. Já se foi o tempo em que os homens usavam ternos e chapéus para uma tarde casual pela cidade. Já se foram os dias dos vestidos bem feitos e dos chapéus elegantes para mulheres. Hoje em dia vejo muitos moletons desalinhados, shorts folgados e até gente de pijama em locais públicos. O autor Tom Wolfe, que era conhecido por se vestir bem, lamentou esse tipo de pessoa que “aperta o casual até gritar por misericórdia”.
O direito de ser casual
Wolfe realmente coloca o dedo na questão quando usa a palavra “casual”. Há uma obsessão na modernidade com o nosso direito individual de ser casual. O argumento é que, se estou confortável, isso é tudo que importa. Outras pessoas não devem me dizer o que vestir. A formalidade de vestir-se bem é artificial e desnecessária, então vamos todos nos vestir como quisermos.
Antes de nos rendermos a tal opinião, penso que há algumas considerações a ter em mente.
A conexão entre corpo e alma
A primeira é a ligação da alma com o corpo. É um erro desconectar os dois, presumindo que a pessoa real é apenas a alma invisível enterrada em algum lugar em toda aquela carne desnecessária. Seria igualmente um erro presumir que um ser humano não tem alma e que somos apenas criaturas físicas. A verdade é que nossos corpos e almas estão inextricavelmente ligados. Isso significa que a maneira como vestimos nossos corpos é importante, pois nossas almas são importantes. O exterior reflete o interior.
Somos ícones de Cristo por dentro e por fora. São Gregório Narek faz esta conexão quando pede a Deus: “Limpe o templo do meu corpo / O vaso da minha alma”. Quando nos vestimos bem, fazemos isso porque adornamos a beleza harmoniosa e proporcional da figura humana de uma forma que traz dignidade à nossa humanidade, e também adornamos o templo corporal que abriga a alma.
Em Introdução ao Espírito da Liturgia, o Papa Bento XVI diz algo fascinante sobre o vestuário quando observa que São Paulo “não quer descartar o seu corpo, não quer ser incorpóreo…Ele não quer a fuga, mas a transformação. Ele espera pela ressurreição. Assim, a teologia do vestuário torna-se uma teologia do corpo. O corpo é mais do que uma vestimenta externa do homem – é parte do seu próprio ser, da sua constituição essencial.”
Esta é uma afirmação forte, para conectar a nossa crença na ressurreição corporal à maneira como vestimos esses mesmos corpos. Acho que é uma afirmação que vale a pena ponderar.
Para quem estou me vestindo?
A segunda consideração a ter em mente é perguntar-nos para quem estamos nos vestindo bem. É só para mim? GK Chesterton tem uma visão perspicaz. Em Ortodoxia, ele escreve: "As vestes de Becket são muito ricas e suas refeições muito pobres. Mas então o homem moderno foi realmente excepcional na história; nenhum homem jamais teve jantares tão elaborados com roupas tão feias".
Após sua morte, um segredo foi descoberto sobre Thomas Becket enquanto seu corpo estava sendo preparado para o enterro: por baixo de todas as suas roupas elegantes, ele usava um cilício.
O cilício de Becket era uma forma de penitência, invisível para todos os demais, que coçava e lhe causava irritação constante. Chesterton diz: “Becket se beneficiou do cilício, enquanto as pessoas na rua se beneficiaram do carmesim e do dourado”.
Em outras palavras, as roupas bonitas eram por respeito a Deus e às outras pessoas. Becket se vestia bem, não para si, mas para os outros. As roupas eram um reflexo da glória de Deus. Acho que esse ainda é um bom princípio para nós hoje.
Vestimo-nos bem para mostrar respeito pelos que nos rodeiam e pelo nosso Criador. A roupa não tem a ver com o nosso conforto individual.
O resgate do vestir-se bem
Eu diria que, mesmo que haja controvérsias públicas em curso sobre como se vestir em certas instituições, a conveniência dos códigos de vestimenta e o sempre presente debate sobre a modéstia, noto um resgate voluntário entre os frequentadores das missas da minha paróquia ao vestir-se tão bem quanto possível.
Ao fazerem isso, eles não estão se exibindo ou demonstrando uma formalidade rígida – eles estão tentando mostrar a Deus o quanto o amam. Eles estão sinalizando através de suas roupas que este é um evento importante.
Há uma grande variedade de roupas que se enquadram na categoria das melhores roupas de domingo. Pode variar de um belo par de jeans com suas melhores botas de cowboy até um terno de algodão com gravata borboleta. Certos minimalistas ou religiosos que praticam o ascetismo podem possuir pouquíssimas roupas, e tudo bem! Mas lembre-se de que até São Francisco de Assis usava belas vestimentas quando era diácono na missa.
A questão não é quem tem o terno mais caro ou o vestido mais chamativo e, certamente, não é julgar uns aos outros com base na aparência exterior. A questão é que todos nós, à nossa maneira, somos chamados a dar o nosso melhor.
Adornamos o corpo para revelar a sua beleza, para reconhecer que somos, de fato, feitos à imagem de Cristo. Somos suas melhores criações.