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O amor à primeira vista e por que a incerteza é essencial para a fé

subway New York contemplation slow
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Gerard Gayou - publicado em 08/11/23
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Joseph Ratzinger ajuda a compreender por que a incerteza é necessária para a fé

Minha única experiência de amor à primeira vista aconteceu no metrô de Nova York. Não, não foi por alguém que estava viajando comigo; foi pela lotada, escura e sufocante estação Borough Hall, no Brooklyn, no final de maio de 2018 – meu segundo dia na maior cidade dos Estados Unidos.   

As multidões que caminhavam rapidamente encheram-me de energia. As pessoas reviravam os olhos e murmuravam palavras escolhidas diante dos frequentes atrasos do trem, dando-me a sensação daquele pertencimento que surge através das dificuldades compartilhadas. Depois de meia hora a bordo, quando os solavancos do vagão se tornaram nauseantes para o novato, o sistema de som anunciou minha estação. Cinco minutos depois, eu estava na 51st Street com a Madison Avenue, ouvindo os sinos da Catedral de St. Patrick repicarem contra o barulho do trânsito da hora do rush no centro de Manhattan.

Sinto-me atraído pelas cidades, assim como as crianças são atraídas pelas montanhas-russas. E assim como as crianças não querem sair do parque de diversões, raramente quero me afastar desses centros movimentados da vida. O meu amor pela metrópole encontra ressonância num mundo em urbanização, porém esse é um mundo que tem pouca paciência para a incerteza, o que é uma marca distintiva de estilos de vida mais nômades. Mas Joseph Ratzinger ajudou-me a compreender por que a incerteza é necessária para a fé.

Ele escreve em Introdução ao Espírito da Liturgia que o nosso mundo é diferente do mundo bíblico precisamente por estes motivos. O monoteísmo, observa ele, não se desenvolveu em torno do estilo de vida agrário estável que alimentava as grandes cidades da Mesopotâmia. Em vez disso, ele escreve: “Foi no deserto, onde o céu e a terra se enfrentam em total solidão, que o monoteísmo foi capaz de crescer – na falta de moradia do andarilho, que não diviniza lugares, mas tem que constantemente colocar sua confiança no Deus que vagueia com ele”. Para o andarilho, nenhuma cidade pode oferecer a segurança de caminhar com Deus na fé.  

O risco de viver uma vida inteira na cidade, então, pode residir na tentação da auto-suficiência. Quando divinizo um lugar, digo a mim mesmo que tenho tudo onde estou; não há necessidade de olhar para fora ou para cima. Talvez haja uma pequena distância entre acreditar que Nova York é o centro do mundo e acreditar que Nova York é o centro do cosmos – sem ter consciência das estrelas acima das luzes brilhantes dos arranha-céus. Para o nômade ou rural, por outro lado, os céus – prova de algo maior que o meu mundinho – são uma realidade evidente.  

Não defendo a vida na cidade; muito do meu coração está convencido da bondade daqueles bairros periféricos e aldeias. A plenitude dessa vida é encontrada no homem que nunca se esquece das estrelas – mesmo no metrô de Nova York.  

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